A História já deixou mais do que claro que o Oscar não tem nada a ver com qualidade, e sim com carisma, popularidade e, acima de tudo, marketing. Então, raramente, o melhor realmente leva o prêmio e a maioria dos vencedores não resiste ao tempo, coisa que deve acontecer, novamente, esse ano com a premiação quase certa do musical de ocasião “La La Land”.
Segue então minha ordem crescente de preferência entre os filmes indicados a melhor filme:
Um Limite Entre Nós (Fences) – Esse dramão baseado em uma peça teatral do dramaturgo August Wilson está para o cinema assim como os textões estão para o Facebook. O filme é longo, pretensioso e nunca deixa de ser puro teatro filmado, além de ver inverossímil (Denzel Washington é um gari analfabeto eloqüente como um político). Só Viola Davis consegue injetar certa leveza nesse longa engessado por sua própria natureza.
Até o Último Homem (Hacksaw Ridges) – O novo trabalho de Mel Gibson é aquele típico filme ufanista que só mesmo os norte-americanos agüentam. Sem um pingo de sutileza, o cineasta trata essa história baseada em fatos reais da forma mais maniqueísta possível, apostando em diálogos empostados, câmera lenta e trilha sonora edificante para emoldurar cenas de guerra filmadas de maneira pornográfica. Outro problema é que a empatia do personagem principal (Andrew Garfield) surge apenas do fato dele estar cercado por babacas.
La La Land – Na teoria, esse longa foi vendido como mais uma salvação do gênero musical, mas na prática, o filme é um musical de ocasião quase envergonhado. As canções não são marcantes, a coreografia e os atores são desajeitados e a trama é tão bobinha quanto uma comédia romântica dessas bem genéricas. Emma Stone e Ryan Gosling tem carisma juntos e estão simpáticos, os vestidos coloridos são bonitos e o final é agridoce, mas é muito pouco para uma produção com 14 indicações ao Oscar.
A Qualquer Custo (Hell or High Water) – Esse western moderno segue uma linha bem Robin Hood, mas fica difícil sentir empatia por personagens que representam tão bem o que há de errado com o macho branco norte-americano médio, tanto em relação aos “mocinhos” quanto aos “vilões”. Mas o roteiro acerta em cheio ao ir direto ao ponto, e o diretor consegue criar uma narrativa envolvente com a ajuda do elenco competente (até Jeff Bridges e sua eterna macaúba na boca não atrapalham).
Lion – Esse longa segue à risca a cartilha dos filmes baseados em histórias reais, resultando em um longa bem simpático e emocionante, ainda que não apresente nada de novo ao mundo do cinema. O elenco é competente e o longa já começa ganhando com os olhos grandes e o sorriso honesto do pequeno protagonista. A fotografia cheia de planos abertos de lindas paisagens agrada aos olhos, enquanto a trilha sonora te pede para chorar. E o final é um grande abraço apertado no coração do espectador.
Moonlight – Barry Jenkins dirige “Moonlight” com delicadeza, criando cenas bonitas e poéticas. Dividido em três partes, o longa parece ter a missão de mostrar que, no fundo, conhecemos muito pouco da história do outro, suas dores, anseios, medos e bagagem emocional. Mas a própria estrutura fragmentada do roteiro impede que o espectador crie um laço emocional mais forte com o protagonista, já que tudo parece ser pouco desenvolvido. A proposta parece ser exatamente essa, a de explorar o não-dito, o subliminar, o que fica nas entrelinhas. Mas é justamente isso que faz com que o longa não seja arrebatador.
Estrelas Além do Tempo (Hidden Figures) – É fácil gostar desse filme, principalmente porque ele é a essência do melhor do cinema hollywoodiano, aqui embalado e envernizado com temáticas importantes. O longa é envolvente, divertido e abraça com carinho três personagens defendidas por atrizes exalando carisma. Claro que é Hollywood e, às vezes, o roteiro busca soluções fáceis, mas, no final, essas pequenas falham pouco importam diante da graça do longa e de sua mensagem esperançosa. Quando as fotos reais aparecem ao final, é difícil não querer ficar mais um pouco ao lado de personagens e atrizes tão fascinantes.
A Chegada (Arrival) – Não é por acaso que meu gênero cinematográfico preferido seja ficção científica. Tanto os filmes mais cinéticos e de ação como os existencialistas e mais cabeça são sempre cheio de possibilidades. Caso desse longa dirigido pelo ótimo Denis Villeneuve que quase apela para o óbvio, mas mantém-se firme em sua proposta complexa e difícil. Eu passei o longa praticamente inteiro em dúvida sobre o que estava assistindo, até que tudo fez um sentido enorme, e eu tive certeza de estar vendo um desses filmes que ficam para a vida. E ele ainda é audiovisualmente lindo e traz Amy Adams (o fato dela não ter sido indicada é um crime) em seu melhor papel.
Manchester à Beira-Mar (Manchester by the Sea) – Li um texto que critica esse filme porque ele nos faz sentir empatia pelo típico macho branco que se acha superior e, provavelmente, votaria no Trump. Independente de quem o personagem de Casey Affleck votaria, ele, às vezes, age como um babaca, mas é apenas uma pessoa partida que não sabe superar a tragédia da própria vida. O diretor e roteirista Kenneth Lonergan parece compreendê-lo e cria um filme triste como seu protagonista. Mas o longa não é um melodrama edificante, e o diretor filma tudo com um certo distanciamento muito bem-vindo (a aposta do roteiro em filmar cenas-chave sem nenhum texto é brilhante). Já Casey Affleck abraça o personagem de uma forma que, realmente, é difícil para o espectador não colar em seu sofrimento, angústia e descolamento em relação ao mundo.