Oscar 2020: Minha ordem de preferência dos indicados a melhor filme

“Retrato de uma Jovem em Chamas”, o melhor filme de 2019 que recebeu um total de 0 indicação ao Oscar

O Oscar nunca foi e nunca será sobre qualidade ou talento, parecendo cada vez mais um concurso de popularidade em que atores, diretores e produtores precisam fazer campanhas para chegar na reta final da “corrida” pelas indicações e premiações propriamente ditas, assim mesmo, como se fossem carros ou cavalos e não artistas e/ou profissionais técnicos.

Com o passar do tempo, o chegar da idade e depois de anos acompanhando a palhaçada toda, fica cada vez mais difícil levar o prêmio a sério, principalmente porque consenso (a base da premiação) raramente combina com qualidade, ousadia e mesmo a subjetividade dos gostos de cada um.

O resultado são filmes medíocres levando “o selo de qualidade” do Oscar. Longas como “Green Book”, “O Jogo da Imitação”, “Bohemia Rapsody”, “Nasce uma Estrela”, “Um Sonho Possível”, “Tão Forte e Tão Perto” são indicados ou recebem prêmios, enquanto maravilhas como “Ad Astra”, “Retrato de Uma Jovem em Chamas”, “A Despedida”, “Atlantics”, “Bacurau”, pra citar os melhores de 2019, passam praticamente batido.

Como velhos hábitos são difíceis de mudar, sigo acompanhando o circo. Eis então minha ordem de preferência dos indicados a melhor filme no Oscar 2020:

Ford vs Ferrari: Um dos poderes do bom cinema é pegar um tema que não te interessa nada e mesmo assim transformá-lo em algo que te emociona. É o caso desse filme que finge girar em torno de automobilismo, mas está mais interessado na relação entre os personagens de Matt Damon e Christian Bale. Em seu melhor trabalho, James Mangold usa o tudo o que Hollywood tem a oferecer para criar um espetáculo que é puro entretenimento. Os recursos estão todos lá no lugar certo (um design de som dos deuses, uma edição precisa, uma trilha sonora certeira, um elenco carismático) em prol da história envolvente e de uma produção de encher os olhos. É Hollywood gritando aos quatro ventos que ainda sabe fazer um bom cinemão.

Parasita: Joon-ho Bong pega um elenco maravilhoso e um roteiro certeiro para criar um desses filmes certos lançado no momento perfeito. A primeira metade do longa é genial, acertando em cheio no tom meio cômico que satiriza uma família pobre e esperta que se aproveita sem pena de uma família rica e ingênua (ou otária mesmo). Na segunda metade, o humor fica um pouco de lado para focar na bizarrice das situações e na luta de classes propriamente dita. No final, a produção parece afirmar que, no mundo atual, não existe mesmo espaço para a paz entre os mais ricos e os mais pobres. Enquanto as notícias da vida real só mostram que Joon-ho Bong tem toda a razão, a repercussão e a recepção ao longa transformaram “Parasita” no filme do ano. 

História de Casamento: Dirigido por Noah Baumbach inspirado em sua própria experiência de divórcio (com a atriz Jennifer Jason Leigh), o longa funciona perfeitamente graças ao ótimo roteiro que se divide muito bem entre delicadeza (a cena dela cortando o cabelo dele) e destruição (os dois vomitando ódio um contra o outro) e ao elenco afiado (Adam Driver, Scarlett Johansson, Laura Dern, Alan Alda e Ray Liotta) que defende com unhas e dentes essa difícil história de um divórcio amigável que vira um inferno. Com isso em mãos, Baumbach dirige o melhor filme do Woody Allen em anos.
Adoráveis Mulheres: A nova versão de Greta Gerwig para um clássico da literatura norte-americana é uma graça, muito bem filmada e emoldurada por um elenco dos deuses (Laura Dern, Meryl Streep, Saoirse Ronan, Florence Pugh, Emma Watson, Timothée Chalamet). Apesar da encenação luxuosa, a filme demora a engrenar graças a uma estrutura fragmentada que, inicialmente, parece gratuita. Na metade do longa, o recurso começa a fazer mais sentido e resulta em cenas genuinamente emocionantes. Os maiores poréns do longa, no entanto, são a escolha errada de usar a mesma atriz no papel de Amy criança e adulta (por melhor que Pugh esteja, a estratégia não convence) e a memória afetiva da versão (mais tocante) de 1994, em especial de uma Jo bem mais energética e presente interpretada por Winona Ryder.
1917: Se “Ford vs Ferrari” uso os recursos em prol da história, o novo filme de guerra de Sam Mendes aposta no inverso, usando um roteiro esquemático para colocar os recursos em primeiro plano. O resultado dessa trama contada como se fosse um único plano-sequência é uma experiência sensorial amparada por belas cenas (em especial a primeira noturna) e pela ótima interpretação de George Mackay. Embalagem e plasticidade, no entanto, não são tudo e o longa acaba soando distante e anticlimático, perdendo o impacto na medida em que a “história” vai se desenvolvendo.

Era uma vez em… Hollywood: O maior problema dos últimos filmes do Quentin Tarantino é o próprio Quentin Tarantino, cada vez mais preocupado em mostrar que é fodão do que contar propriamente uma história. Nesse aqui, o diretor abandona completamente a ideia de trama para focar em um desfile de estilo e um mar de referências cinematográficas e televisivas. Para quem assiste a um filme buscando uma narrativa corrente, o longa pode virar uma longa (2h40) decepção em forma de uma colagem de cenas aleatórias. Mas quem for ao cinema apenas pra ver Tarantino “se amostrando”, o filme pode ser uma delícia embalada por uma bela direção de arte, figurinos coloridos e um trio de protagonistas muito loiro, lindo e bronzeado. 

Jojo Rabbit: Vira e mexe, Hollywood pega um tema pesado e polêmico e dá a ele uma roupagem mais leve com direito à lição de moral no final. Foi assim com o sofrível “Green Book”, por exemplo, que minimiza a questão do racismo. O novo filme de Taika Waititi é mais feliz ao usar o nazismo de maneira irônica e sarcástica. Amparado por um ótimo elenco infantil-juvenil (Roman Griffin Davis, Thomasin McKenzie e Archie Yates) e pegando emprestada a estética hipster de Wes Anderson, Waititi entrega um trabalho divertido e fofinho, mas completamente esquecível, ainda que não há nada de errado nisso.

O Irlandês: Só a carreira já consolidada de Martin Scorsese para justificar a inclusão na lista do Oscar de mais uma produção do cineasta que gira em torno do universo de machos e máfia, mesmo que esse exemplar seja um loooongo e nem um pouco memorável déjà vu de 3h30 de outros trabalhos bem melhores do diretor. Al Pacino e Joe Pesci se destacam, enquanto Robert DeNiro é soterrado por efeitos especiais que tentam deixá-lo mais jovem sem nunca convencerem. No mais, a produção é bem padrão, com fotografia, direção de arte e figurinos nada memoráveis sendo indicados ao Oscar só porque é assim que tem que ser. A indicação mais sem sentido, no entanto, é a pela edição de 3h30 que poderia muito bem durar apenas 2h.

Coringa: Em 2009, a indústria cinematográfica foi abaixo porque “Batman, o Cavaleiro das Trevas” recebeu 8 indicações ao Oscar, mas foi ignorado nas categorias de melhor filme e direção. O bafafá foi tamanho que a Academia mudou as regras da premiação e expandiu o número de indicados na categoria principal já no ano seguinte. Onze anos depois, “Coringa” rendeu mais de 1 bilhão de dólares nas bilheterias e recebe agora impressionantes 11 indicações ao prêmio, incluindo filme, direção (para um diretor que copia o estilo de Martin Scorsese porque não tem talento para ter um estilo próprio), ator (um Joaquin Phoenix no limite do overacting) e roteiro adaptado, mesmo sendo genérico, simplista e bastante inferior à produção de Christopher Nolan.

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