Não olhe para cima

Hollywood já explorou a colisão de asteroides com a Terra algumas vezes, sempre pela via da catástrofe (“Impacto Profundo”) ou da ação (“Armageddon”). Já o cinema independente e Lars Von Trier optaram pelo lado existencial em “Melancolia”. Um dos diretores mais badalados da atualidade, Adam McKay resolve inovar a trama básica de um cometa se chocando com a Terra ao partir para uma abordagem satírica em “Não Olhe para Cima”. 

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Dono de um cinema que apela para ironia, McKay usa uma descoberta científica que pode decretar o fim da existência humana para refletir sobre o obscurantismo e o negacionismo dos tempos atuais, soltando farpas para todos os lados, dos políticos que deixam a verdade de lado para criar suas próprias narrativas à mídia que explora as dualidades do certo e errado, verdade e mentira, direita e esquerda para ganhar audiência e gerar mais lucro.

A ideia é boa e funciona em partes. O problema é que além da ironia, o cinema de Adam McKay também aposta no óbvio e em um texto mastigado que precisa deixar muito claro suas intenções, ainda que para isso uma piada tenha que ser contada e recontada. O cineasta é conhecido por um tipo de filme que se acha muito mais esperto do que realmente é, explorando temas importantes por meio do humor, mas de uma forma superficial e usando gags visuais que parecem muito inovadoras, mas já eram usadas por Guel Arrais em seus programas de televisão lá no começo dos anos 1990.  

Abraçado por Hollywood por sua visão progressista, o diretor veio de comédias besteiróis (“O Âncora”, “Quase Irmãos” e “Os Outros Caras”) e fez a curva para produções mais ambiciosas em “A Grande Aposta” e “Vice”, ambos indicados ao Oscar de melhor filme. Para vender sua visão de como o capitalismo selvagem e a ignorância estão prestes a destruir o mundo (e realmente estão, meu problema com o filme não é esse), McKay reúne meia Hollywood para contar sua versão farsesca do apocalipse. 

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Com Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, Jonah Hill, Meryl Streep, Cate Blanchett, Mark Rylance, Timothée Chalamet e mais um monte de gente, “Não Olhe para Cima” tem seus momentos, mas parece um grande esquete de programa humorístico esticada à exaustão. Aos 90 minutos, todas as piadas já foram contadas e repetidas e ainda resta quase mais uma hora de filme para o diretor repetí-las mais algumas vezes. É quase como se McKay não confiasse plenamente em seu público para entender que o empreendedorismo e a política estão acabando com nosso planeta, seja por ações concretas ou por dividir as pessoas em narrativas opostas de pensamento.

Se o texto de “Não Olhe para Cima” é pobre e repetitivo, pelo menos o elenco compra sem reservas a proposta do longa. Ainda que vários dos atores tenham pouco tempo de tela e funcionem mais como tipos do que propriamente personagens, pelo menos os protagonistas (vividos por Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence, usando uma peruca inexplicável) são bem desenvolvidos e defendidos pelos atores, que apostam no humor físico e na cara de desespero.

Uma dessas produções bancadas pela Netflix para o streaming provar que tem poder e sabe fazer mais do que conteúdo descartável, “Não Olhe para Cima” é uma aposta ousada que morre na praia da repetição e da superficialidade. Ainda assim, o longa consegue ser divertido em alguns momentos e emocionar em os outros, principalmente já perto do final quando o longa desiste de mastigar as piadas para humanizar os personagens. Indicado aos Globo de Ouro de melhor comédia, ator e atriz em comédia e roteiro, “Não Olhe para Cima” é uma das apostas da Netflix para o Oscar 2022.

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