
A princípio, “Smiley” parece mais uma série boba e genérica da Netflix com temática gay (caso da pavorosa “Uncoupled”). Os primeiros episódios mostram um amontado de clichês em meio a uma encenação pobrinha e com cara de produção da Globo Filmes. Mas quem deixar passar essa impressão inicial pode ter a sorte de ver um programa que cresce a cada novo episódio mostrando novas camadas de personagens que parecem antes fadados a repetir estereótipos batidos.
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Não que “Smiley” reinvente a roda. A série está longe de inovar, recorrendo a vários chavões bem básicos das comédias românticas, com pares que aparentemente se odeiam se apaixonando e com gente correndo em um táxi até o aeroporto atrás do seu amor. Mas por trás de toda a obviedade, existe um certo carinho pelas personagens, todas mostrando muito bem a dificuldade que nós adultos temos em sermos honestos com os outros e consigo mesmos.
Grande parte dos encontros e desencontros da série acontecem porque as personagens não conseguem se comunicar. Por um acaso destino (clichê número 1), o arquiteto Bruno tem um date com o bartender Alex. Os dois são completamente diferentes (clichê número 2). O primeiro é culto, gosta de cinema e foge (um pouco que seja) dos padrões gays. O segundo é malhado no estilo “cuida do corpo e da mente” e parece um modelo saído de uma publicidade da Calvin Klein. Não demora muito, os dois se estranham (clichê número 3 e por aí vai), mas o desejo e o tesão são maiores e eles se apaixonam, mesmo não admitindo para ninguém, inclusive eles mesmos.

É nessa dinâmica de idas e vindas em meio a coincidências do destino que a relação/não-relação entre os dois funciona, ditando o ritmo e costurando a série, povoada de outros coadjuvantes que, inicialmente, parecem desinteressantes, mas reforçam a ideia central de “Smiley” de desconexão verbal entre as pessoas. Das amigas lésbicas de Alex ao casal heteronormativo amigo de Bruno, todos parecem terem medo de verbalizar o que sentem, causando dúvidas e sofrimento no meio do caminho.
Com uma boa química entre Miki Esparbé (desconhecido do público brasileiro) e Carlos Cuevas (“Merlí”), “Smiley” consegue divertir e emocionar ao mesmo tempo que retrata esses dramas de modo universal. Ainda que a série se passe em Barcelona, os conflitos entre as personagens falam a todos nós, refletindo e ironizando, por exemplo, comportamentos gays comuns em qualquer cidade grande dominada pela lógica do Grindr.
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Discutindo expectativas amorosas, falta de comunicação nos relacionamentos e o medo da solidão, “Smiley” é sim uma comédia romântica boba, clichê e piegas. Mas a série consegue passar por cima de todos esses “defeitos” e entrega uma trama envolvente e narrada de forma delicada sem mexer muito nos cânones do gênero. Ou talvez eu estava apenas extremamente carente quando assisti à série e apenas me deixei levar.
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