1995 no cinema: 25 anos depois

1995 não é um grande ano para o cinema, pelo menos na minha opinião (1991, 1994 e 1999 são os meus preferidos dos anos 1990). Naqueles tempos que, à distância, pareciam bem mais fáceis, o cinema ainda não tinha sido totalmente dominado por filmes de super-heróis e franquias [a maior bilheteria do ano foi “Batman Eternamente”, que rendeu “míseros” $ 184 milhões, algo que uma superprodução antes do coronavírus ganhava em um final de semana), e o público ainda ia ao cinema atrás apenas de astros (hoje o público corre em busca de mais do mesmo e personagens conhecidos).

Bilheterias “modestas” e hábitos de consumo a parte, 1995 não é, necessariamente, um ano marcante. Mel Gibson ganhou respeito (e o Oscar no ano seguinte) pelo épico “Coração Valente”; Tom Hanks tentou viajar à lua em “Apollo 13”; Sharon Stone pegou carona no retorno dos westerns em “Rápida e Mortal”; Michelle Pfeiffer fez sua versão de “Sociedade dos Poetas Mortos” com “Mentes Perigosas”; Johnny Depp deixou de lado (um pouco) os papéis estranhos no suspense “Tempo Esgotado”; e outros atores como Denzel Washington (“Maré Vermelha” e “O Diabo Veste Azul”), Kevin Costner (“Waterworld”), Dustin Hoffman (“Epidemia”), Sandra Bollock(“A Rede” e “Enquanto Você Dormia”), Winona Ryder (“Colcha de Retalhos”), Julia Roberts (“O Poder do Amor”) e Pierce Brosnan (como o novo 007 em “GoldenEye”) chamaram atenção nas telas.

1995 também viu os novos trabalhos de cineastas como Todd Hayes (“Mal do Século”), Martin Scorsese (“Cassino”), Oliver Stone (“Nixon”), Spike Lee (“Irmãos de Sangue”), Woody Allen (“Poderosa Afrodite”), Paul Verhoeven (com o hoje cultuado “Showgirls”) e o esquisito Todd Solondz (“Bem-Vindo à Casa de Bonecas”), além da estreia do polêmico um dos cineastas mais polêmicos Larry Clark com “Kids”.

Mas não foram esses os filmes que me marcaram e ainda gosto até hoje, 25 anos depois.

Doze Macacos – Um dos trabalhos mais acessíveis e convencionais do bem mais esquisito Terry Gilliam, o filme capricha no visual e é bem envolvente, ainda que o roteiro sobre viagem no tempo e um vírus que dizima a humanidade tenha lá seus furos. Uma das grandes ficções dos anos 1990, o longa ainda se beneficia do carisma e química do elenco, Bruce Willis, Madeleine Stowe e um Brad Pitt que ganhou aqui sua primeira indicação ao Oscar. 

Seven – Os Sete Crimes Capitais – Depois de “O Silêncio dos Inocentes”, ninguém esperava que o subgênero de filmes sobre serial killers fosse ser subvertido tão cedo, até que o segundo trabalho de David Fincher transforma uma trama a princípio banal em um exercício lúgubre de tensão que tem a apatia dos que vivem em grandes metrópoles como pano de fundo. Além da ótima edição, o longa usa bem o elenco (Brad Pitt, Morgan Freeman, Gwyneth Paltrow e, ops, Kevin Spacey) e termina com um dos finais mais chocantes da década de 1990.

Antes do Amanhecer – Céline e Jesse se encontram por acaso em um trem na Europa. A química bate e os jovens decidem passar um dia juntos em Viena, antes dele voltar para os EUA e ela para sua vida. Com uma ótima química entre Ethan Hawke e Julie Deply e diálogos existenciais sobre reality shows e o futuro, Richard Linklater mostra o nascimento de uma paixão, de quebra ganhando o prêmio de direção em Berlim e dando ao mundo uma de suas melhores trilogias. 

Um Sonho sem Limites – Depois do sucesso do ótimo “Terror a Bordo”, Nicole Kidman migrou para Hollywood e penou em papéis sem graça até essa ótima comédia que marca a primeira incursão mainstream de Gus Van Sant. Em um mundo ainda longe das redes sociais, Kidman vive uma mulher que quer ser famosa e estar na televisão a qualquer preço. A atriz entende muito bem o tom sarcástico do roteiro e entrega uma de suas melhores atuações. 

Despedida em Las Vegas – Poucas vezes Hollywood mostrou com tanto apreço e de forma tão crua o encontro entre dois miseráveis, o bêbado suicida de Nicolas Cage e a prostituta solitária de Elisabeth Shue. Mike Figgis não desvia a câmera da solidão e tristeza das personagens e entrega um filme melancólico, honesto e que passa longe da redenção. Apesar do Oscar merecido de Cage, o filme é mesmo de Shue.

Razão & Sensibilidade – Depois dos sucessos de “Banquete de Casamento” e “Comer Beber Viver”, ambos indicados ao Oscar de filme estrangeiro, Ang Lee estreia no cinema de língua inglesa nessa ótima adaptação de Jane Austen, escrita pela atriz Emma Thompson. O resultado é uma das melhores adaptações da escritora, graças ao texto ágil, à direção delicada de Lee e ao elenco (Kate Winslet, Hugh Grant, Alan Rickman etc.). 

As Pontes de Madison – Meryl Streep tem nesse romance dirigido por Clint Eastwood um dos melhores papéis de sua carreira, mostrando um apelo sensual raro. Streep vive uma dona de casa que relembra um dos momentos mais marcantes de sua vida, quando tem que optar pelas obrigações de ser mãe e esposa ou se entregar a uma paixão inesperada. A cena em que a personagem toma sua decisão é uma das mais belas do cinema romântico.

Fogo contra Fogo – Depois de uma série de filmes pouco memoráveis, Michael Mann mostra nesse épico que é um cineasta de mão cheia, com total controle das cenas de ação e suspense. A duração excessiva e o roteiro que se perde entre vários personagens podem desagradar, mas o filme tem duas cenas de assalto e uma perseguição final que são verdadeiras aulas de cinema e edição, além de ter o alardeado, na época, encontro entre Robert De Niro e Al Pacino.

A Flor do Meu Segredo – Infelizmente um tanto esquecido na filmografia de Pedro Almódovar, o filme marca uma transição na carreira do cineasta, aqui deixando o escracho um pouco de lado e apostando em um tom mais maduro e melodramático. Com seus diálogos exagerados e um tanto cafonas e uma ótima Marisa Paredes interpretando uma mulher ferida e prestes a ser abandonada pelo marido, é um dos meus preferidos do diretor. 

Estranhos Prazeres – Antes de ser a primeira mulher a ganhar o Oscar de direção, Kathryn Bigelow deu ao mundo essa crítica sobre racismo disfarçada de sci-fi. Na virada de 1999, Ralph Fiennes se vê no meio de um assassinato de um rapper negro captado por uma nova tecnologia que grava memórias (bem “Black Mirror”) em uma Los Angeles à beira do caos social. O roteiro (de James Cameron) é uma bagunça, mas o filme é puro estilo e tem no elenco Angela Bassett e Juliette Lewis. 

Eclipse Total – Taylor Hackford mistura melodrama e suspense com louvor nesse filme que aborda violência doméstica e sororidade. Com um ótimo roteiro e criando um interessante clima, o diretor ainda faz um bom uso da química entre Kathy Bates e Jennifer Jason Leigh, que interpretam mãe e filha que escondem segredos do passado. Uma das melhores adaptações de Stephen King, aqui mais preocupado com o horror da vida real do que com o terror causado por alienígenas ou criaturas sobrenaturais.

Copycat –  Lançado no mesmo ano que “Seven”, o longa acabou sendo ofuscado, mas tem o seu charme. Ainda que tenha envelhecido (principalmente em termos de figurino) e não fuja muito da fórmula estabelecida pelo gênero, a premissa é interessante o suficiente para prender a atenção (serial killer copia outros serial killers) e a dupla de protagonistas se empenha em suas atuações, Sigourney Weaver vivendo uma mulher frágil que sofre de agorafobia e Holly Hunter interpretando uma policial.

Outros destaques: a Pixar entrou para a história ao lançar a primeira animação 3D com “Toy Story”; Jane Austen ganhau uma modernização com o cult “As Patricinhas de Beveryl Hills”; Susan Sarandon finalmente levou o Oscar pra casa no drama “Os Últimos Passos de um Homem” (foto); o hoje odiado Bryan Singer foi descoberto com o longa “Os Suspeitos” (que deu o Oscar ao também hoje odiado Kevin Spacey); uma das surpresas do ano foi o infantil “Babe, Um Porquinho Atrapalhado”; e o italiano “O Carteiro e o Poeta” chegou ao Oscar e foi indicado para melhor filme, direção, ator e roteiro adaptado; além do início da retomada do cinema brasileiro (praticamente morto no começo dos anos 1990) com os sucessos “Carlota Joaquina” e “O Quatrilho” e o ótimo “Terra Estrangeira”.

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s