
Não é fácil repaginar um personagem tão icônico como o homem-morcego. São muitas visões e releituras para alguém chegar ao novo “Batman” sem nenhuma bagagem. Temos a visão cômica e lisérgica do seriado dos anos sessenta, a versão cartunesca e sombria de Tim Burton, o carnaval de cores gritantes de Joel Schumacher, o realismo brutal e violento de Christopher Nolan e a escuridão solene e pesada de Zack Snyder.
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Mais conhecido por “Cloverfield: Monstro” e pelos episódios mais sangrentos da releitura de “O Planeta dos Macacos”, Matt Reeves parece não ter medo do legado de Batman e das comparações inevitáveis e entrega um filme longo, ousado e, de certa forma, original. Existe aqui um certo senso de desespero pouco presente nas versões anteriores do personagem, com o cineasta apostando ainda mais nas sombras e em uma imagem embaçada (até o tradicional bat-sinal não é visto com nitidez) que parece refletir exatamente a confusão e a própria essência dúbia do herói mascarado.
Lúgubre e exagerado, quase histriônico, “Batman” se afasta um pouco da ambição realista dos filmes de Nolan, optando por uma edição nervosa e uma fotografia escura e difusa que foge da imagem límpida das produções de super-heróis. A câmera de Greig Fraser (favorito para ganhar o Oscar esse ano por “Duna”) cola no rosto dos atores ou em elementos específicos da ação, tirando o foco das cenas como um todo para centrar as lentas nos personagens.

A estratégia torna toda a narrativa ainda mais confusa, já que tudo é muito escuro e disperso, trazendo uma certa energia caótica para o filme. Muito bem encenado e com mortes que lembram os melhores thrillers sobre serial killers, o “Batman” de Matt Reeves parece estar para os filmes de heróis assim como o “Seven” de David Fincher está para o cinema dos assassinos seriais. O resultado é impactante e imponente, ainda que imperfeito em sua ambição grandiosa.
O primeiro porém de “Batman”, no entanto, é o seu roteiro. Mesmo Reeves acertando ao não representar mais uma vez a origem do herói e ao criar um filme cheio de clima e com uma trama envolvente, o longa tem personagens demais que entram e saem de cena sem muita lógica. O Pinguim, por exemplo, parece apenas um desvio de atenção, enquanto a Mulher-Gato deixa de ser uma personagem que bate de frente com o Batman para virar um mero interessante romântico do herói. Já o Charada, o grande vilão da trama, é praticamente esquecido durante uma parte da produção.
Claro que em uma produção grandiosa como “Batman” o público está mais interessado no espetáculo e na forma como os atores interpretam seus personagens favoritos. Nesse quesito, a visão de Matt Reeves não deixa a desejar. “Batman” é muito bem feito, com cenas marcantes e um senso de ação que perpassa todo o longa, ainda que grande parte da duração seja dedicada ao desenvolvimento dos personagens e ao desenrolar de uma investigação que envolve mortes, corrupção, política, máfia e o passado da família Wayne.

O longa segue, inclusive, os passos de “Coringa”, com a família Wayne sendo retratada de forma menos ingênua e mais próxima da visão que temos de grandes impérios familiares e de donos de corporações. A ideia, no entanto, parece prender eternamente Bruce Wayne eternamente sob a sombra de seus pais, o que destoa um pouco da proposta do filme de não mostrar novamente a origem do herói.
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Mas a verdade é que esses são apenas alguns pequenos defeitos de um filme irregular que consegue ter uma identidade própria dentro de um universo em constante reinvenção. Robert Pattinson, por exemplo, se sai muito bem em uma releitura mais grunge e suja de Bruce Wayne/Batman. A química entre ele e Zoë Kravitz (uma Selina Kyle/Mulher-Gato bem menos empoderada e ciente de seu poder sobre os homens do que a insuperável Michelle Pfeiffer de “Batman, O Retorno”) é boa e funciona dentro da lógica do filme.
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Já o Pinguim de Colin Farrel (em sua melhor imitação de Robert DeNiro) parece apenas um coadjuvante de luxo, ficando bem atrás da reimaginação esquizofrênica de Paul Dano para o Charada, a grande força motora de “Batman”. Com um final caótico e grandiloquente, longo demais e, às vezes, confuso, “Batman” é um filme digno que consegue recuperar a fé no personagem depois da catastrófica passagem de Ben Affleck pelo papel.
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